Caminhando pelas ruínas do templo, vê-se o mato subindo literalmente pelas paredes, um imbé gigantesco e grama onde era o piso.
O passado pode assustar, surpreender e, muitas vezes, causar encantamento. Diante do que restou da Igreja de Nossa Senhora da Conceição, esses verbos e sentimentos vêm à torna, remetendo à obra de Aleijadinho, à arte colonial e à história de Minas. Sempre preocupada com a situação das ruínas tombadas pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha-MG) – em 2001, as paredes frontais foram escoradas com vigas de ferro, pela Usiminas, via parceria com o Iepha –, Lêda Torres de Andrade, há 35 anos proprietária da fazenda, escreveu o livro Jagoara – Do pó de ouro ao pó do tempo, e agora se sente “satisfeita e orgulhosa” com a devolução de peças.
“Estudei e pesquisei muito para escrever o livro. Aleijadinho trabalhou aqui, fez o projeto, dirigiu a construção, se encarregou dos ornamentos. Nesse período de quatro anos, ele atuou também na Igreja de Nossa Senhora do Carmo de Sabará”, diz Lêda Torres, lembrando que, naquela época, a região de Matozinhos estava vincula à Vila Real de Nossa Senhora da Conceição de Sabará.
Hoje, caminhando pelas ruínas do templo, vê-se o mato subindo literalmente pelas paredes, um imbé gigantesco e grama onde era o piso. Numa construção ao lado, fica o sino datado de 1855. “Este é o segundo sino, o outro não sabemos onde foi parar”, diz a proprietária.
Da imponência ao abandono
Situada a 20 quilômetros de Matozinhos, a Fazenda da Jaguara foi uma das maiores e mais importantes propriedades rurais do período colonial em Minas. Depois de pertencer a Francisco Cunha de Macedo, ela foi adquirida pelo minerador português Antônio de Abreu Guimarães, que, em 1786, ergueu a igreja dedicada a Nossa Senhora da Conceição, substituindo uma velha capela. “Sob os auspícios do potentado Antônio de Abreu Guimarães, ali trabalhou, entre 1786-1788, o maior mestre do barroco mineiro, Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, que produziu os altares, os púlpitos, o coro, os móveis e muitas imagens sacras e peças de talha para decorar o templo”, escreveu Marcos Paulo em artigo publicado no Estado de Minas.
No início do século 20, começou a derrocada. Com a compra da fazenda pelo inglês George Chalmers, que havia sido diretor da Mina de Ouro Morro Velho, a edificação foi sendo relegada ao abandono. “Por ser protestante e não querendo uma igreja católica em funcionamento nas suas terras, mas certamente sabendo que os bens que guarneciam o templo não lhe pertenciam, o inglês Chalmers passou a enviá-los a outras igrejas, para que pudessem continuar a servir ao culto religioso.” Em 1910, o conjunto mais expressivo (altar-mor e laterais, tarja do arco-cruzeiro, altar da sacristia, dois púlpitos e tribuna de coro) seguiu para Nova Lima, sendo inserido na Igreja de Nossa Senhora do Pilar”.
E mais: a imagem de Nossa Senhora da Piedade, de autoria do Aleijadinho, foi enviada à capela do Bagre, hoje cidade de Felixlândia, da qual é a padroeira, e outras foram incorporadas ao patrimônio de capelas de Pedro Leopoldo e região. “Assim, a Jaguara pode ser considerada a igreja-mãe de vários templos mineiros. Infelizmente, muitas outras obras de talha (parte do coroamento de um altar e florão com anjo contendo o nome de Antônio de Abreu Guimarães em uma fita), imaginárias (pomba representando o Divino Espírito Santo, Nossa Senhora das Dores, Santa Rita e São Jerônimo), cantarias, peças de madeira, móveis e ferragens foram parar nas mãos de antiquários e colecionadores.
Por Gustavo Werneck
Fonte: em.com.br
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