A Igreja de São Francisco com o seu cruzeiro |
História
O convento foi fundado em 1585 pelo frei franciscano Melchior de Santa Catarina, Custódio de Olinda, em Pernambuco, após receber autorização do papa Sisto V. No local já havia uma pequena capela e algumas habitações provisórias. No mesmo ano, a convite do bispo Dom Antônio Barreiros, o Custódio enviou dois irmãos para a Bahia, os freis Antônio da Ilha e Francisco de São Boaventura, com a responsabilidade de providenciar a instalação do convento e dar início às obras, que só começaram de fato em 1587.Em 1675 foi decidida uma reconstrução, sob a administração do Provincial frei Vicente das Chagas, que autorizou o frei Daniel de São Francisco a angariar donativos para as obras. Como a congregação havia crescido, os novos edifícios foram projetados em uma escala mais ampla.As obras tiveram início oficial em 20 de dezembro de 1686, quando lançou-se a pedra fundamental. O claustro foi construído primeiro, com projeto de Francisco Pinheiro. Em 1701 foi dada autorização para que a Ordem Terceira construísse sua própria igreja, cemitério e outras dependências. A partir de 1705 foram colocados revestimentos no claustro e erguido o altar da enfermaria, e entre 1710-1710 foram concluídos os muros e lançados os pilares. Sua decoração de azulejos pintados foi realizada entre 1749 e 1752.
Capelas laterais na igreja |
A capela-mor, o arco do cruzeiro e as paredes até onde ficariam os púlpitos estavam prontos em 1713, já podendo abrigar o culto, sendo consagrado este trecho em 3 de outubro. O restante do corpo da igreja, incluindo a fachada em arenito, foi terminado em 1720, data gravada no frontispício. No mesmo ano foi instalado o cadeiral do coro, reaproveitado da edificação anterior, e em seguida iniciaram as obras de decoração interna.
Em 1729 o frei Álvaro da Conceição providenciou à conclusão dos pilares do claustro, e a partir de 1733 iniciaram as pinturas do teto da igreja, obra do frei Jerônimo da Graça. Em 1737 foram colocados azulejos na capela-mor, no ano seguinte começou o arremate dos pilares do claustro, o douramento do capela-mor e altares laterais da igreja, e a execução do retábulo de São Luís ao lado do arco do cruzeiro. Em 1741 o frei Manoel do Nascimento iniciou o revestimento do piso e foi encomendado um grande retábulo de Nossa Senhora da Glória, instalado também ao lado do cruzeiro. Entre 1749 e 1752 foram finalizadas as obras do claustro, incluindo a biblioteca, e a partir de 1752 foram sendo terminadas a portaria e seu altar. Em 1782 foram colocados azulejos na portaria. As torres foram concluídas entre 1796 e 1797, instalando-se os sinos e o relógio, mas o revestimento de pedras azuis e brancas nos coruchéus teve de esperar ainda cerca de um século para ser instalado.
Características
Interior da igreja |
Igreja
A igreja é especialmente preciosa pela sua exuberante decoração interna. Todas as superfícies do interior - paredes, colunas, teto, capelas - são revestidas de intrincados entalhes e douraduras, com florões, frisos, arcos, volutas e inúmeras figuras de anjos e pássaros espalhadas em vários pontos. Calcula-se que foi usada uma tonelada de ouro nos douramentos.
Não se conhece o autor da talha. De ambos os lados existem grandes púlpitos, também ricamente decorados.
Detalhe da capela-mor |
O teto da nave possui pinturas sobre o ciclo mariano atribuídas por Augusto Telles ao frei Jerônimo da Graça, realizadas entre 1733 e 1737. O cadeiral entalhado do coro e a estante para o missal, bem como as grades entre as capelas secundárias, são obra do frei Luís de Jesus, conhecido como "irmão Torneiro", e são os elementos decorativos mais antigos da igreja, datando do século XVII, reaproveitados da primeira igreja edificada no local. Sobre o parapeito do coro existe ainda um rico oratório com um crucifixo e dez pequenos nichos para relíquias de vários santos, entre elas um crânio de um mártir não identificado, a quem se atribuiu o nome de São Fidélis Mártir, doado pelo papa Inocêncio XII. Entre suas jóias estão também uma estátua de São Pedro de Alcântara criada pelo santeiro baiano Manuel Inácio da Costa, outra de Santo Antônio, possivelmente encomendada por Garcia d'Ávila, e uma série de painéis de azulejo pintados com cenas da vida do padroeiro, criados em 1737 por Bartolomeu Antunes de Jesus, artista lisboeta. As pias de água benta debaixo do coro, à entrada, foram doadas, segundo a tradição, por Dom João VI, e o piso tem revestimento decorado acompanhando o padrão dos entalhes do teto.
Detalhe da obra de talha na igreja |
Convento
Outros espaços dignos de nota são a biblioteca, com um pequeno altar dedicado a São Boaventura, um teto decorado com grandes pinturas de Doutores da Igreja e estantes coroadas por entalhes; o refeitório, com outros painéis azulejados datados de c. 1650, pertencentes à primeira igreja construída no local, e a sala-capela do Capítulo. Esta última tem o teto decorado com uma grande série de pinturas em caixotões que representam virgens mártires, mais um imponente altar dedicado a Nossa Senhora da Saúde, azulejaria pintada e oito painéis parietais com temática retirada do ciclo mariano, especialmente as Litaniae Lauretanae. A fonte iconográfica foi identificada na obra Elogia Mariana, publicada em Augsburgo em 1732, com ilustrações de August Casimir Redel e Thomas Scheffler. O jardim do convento também serve como pequeno cemitério, onde foram depositados os despojos de várias personalidades franciscanas, como o frei Vicente do Salvador e o frei Antônio de Santa Maria.
Importância estética e cultural
Essa abundância decorativa era parte essencial do estilo Barroco, incentivada pelas determinações do Concílio de Trento, e tinha como objetivo conquistar os fiéis e excitar sua devoção através da maravilha e do deslumbramento, ao mesmo tempo em que oferecia uma série de pinturas e estátuas que ilustravam a doutrina católica para a educação do povo analfabeto. Mesmo que a suntuosidade fosse uma característica comum dos templos barrocos, a riqueza extraordinária da igreja levantou questionamentos desde o início. No século XVIII o templo foi visitado por capuchinhos italianos, que ficaram indignados com tanta ostentação, e elaboraram um documento em que lamentavam o abuso e as constantes solicitações de esmolas pelos frades para completar a decoração. No século XIX franciscanos alemães também protestaram, pretendendo eliminar todo o ouro das igrejas salvo nos aparatos litúrgicos e no tabernáculo do Santíssimo Sacramento, mas a medida não encontrou receptividade.
Apesar da grande homogeneidade da decoração como um todo, o estilo dos elementos em separado, em seu estado atual, pode variar bastante, mostrando traços maneiristas, rococós e até neoclássicos, embora o Barroco predomine, o que se explica pelo largo período de tempo necessário para construir e decorar as estruturas, e pelas reformas, restauros ou alterações que o conjunto sofreu em sua história.
Contrastando com o luxo dos edifícios, a vida monástica que se desenvolve hoje no convento é marcada pela austeridade. Os frades seguem o voto de pobreza, dedicam-se à oração e às obras pias e, segundo disse o frei Hugo Fragoso, "a vivência pessoal dos religiosos sempre foi pobre... A cada reforma católica, há uma tentativa de resgate da maneira de viver de Francisco de Assis, com a substituição de algumas casas suntuosas por eremitérios. A tensão é permanente ao longo dos séculos.... Ao contrário dos franciscanos do século de ouro, os de hoje lutam pelo resgate do essencial". O mobiliário das celas dos frades se resume em uma cama, um armário e uma escrivaninha.
Em 2009 foi publicado o primeiro levantamento histórico, social e estético aprofundado sobre os edifícios, o livro Igreja e Convento de São Francisco da Bahia, após uma pesquisa de 10 anos realizada pela historiadora Maria Helena Ochi Flexor em conjunto com o frei Hugo Fragoso, trazendo textos de vários especialistas.
Desde o século XVIII acontece às terças-feiras, no largo diante da igreja, a tradicional bênção dos pães de Santo Antônio, um santo franciscano, com a maior participação popular no dia da sua festa, 13 de junho, e na festa de São Francisco, 17 de setembro, quando chegam a ser distribuídos 15 mil pãezinhos.
Conservação
O retábulo original da capela-mor, então seriamente carcomido, foi quase todo modificado, além de serem retiradas estátuas portuguesas de São Domingos e Santo Antônio. Desta época data a entronização do grande grupo escultórico no altar-mor, obra moderna de Pedro Ferreira, e a substituição da antiga estátua de São Luís de Toulouse na capela direita do transepto por uma representando o Sagrado Coração de Jesus. Recentemente a troca foi desfeita, bem como retornou ao seu lugar a imagem de Santa Ifigênia, também removida anteriormente.
Durante as obras de revitalização do centro histórico de Salvador, há poucos anos, a igreja, o convento e seu largo fronteiro também receberam atenção conservadora, mas o monumento precisa de cuidados permanentes. Em 2005 os azulejos do claustro foram cobertos por gaze para evitar que a superfície pintada se desprendesse, o que já se verifica em muitos pontos. Foi solicitado um restauro emergencial ao Iphan, mas em vista do alto custo da obra não houve condições de realizá-la. Em 2006 foi realizado um projeto de pesquisa empregando-se técnicas de fotografia e restauro digital a fim de preservar pelo menos a iconografia dos azulejos antes que ela seja perdida inteiramente, a fim de que um futuro trabalho de restauração possa ter subsídios consistentes. Além disso, por causa de suas preciosidades a igreja já foi vandalizada várias vezes e teve várias peças originais roubadas.
A necessidade de conservação, coisa sempre muito cara em se tratando de monumentos históricos tão preciosos, também se choca com os interesses da comunidade franciscana, cujo objetivo central é o trabalho com os pobres. O frei Hugo Fragoso disse em 2010 que os freis não podem viver para os conventos, mas para suas obras assistenciais e pastorais. Em que pese sua enorme importância, são relativamente poucos os turistas que o visitam, e um programa para tornar o complexo autossustentável ainda está por ser feito; tudo o que se refere à sua conservação ainda depende basicamente do governo.
Wikipédia
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Indicação do amigo Márcio Braga
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