domingo, 20 de novembro de 2011

Ó Beleza tão antiga e tão nova!

Por Dom Henrique Soares da Costa
Bispo titular de Acúfida
Auxiliar da Arquidiocese de Aracaju.


Recentemente participava como Bispo da reinauguração do Palácio do Governo de Sergipe. Um belo trabalho. Apreciava algumas obras de arte. Alguém me perguntou, diante de algumas pinturas de várias escolas, estilos e épocas, de qual eu mais gostava. Apontei uma, que decepcionou meu interlocutor: “O senhor, tão jovem, com um gosto tão acadêmico?” Não! Não é gosto acadêmico! É sede do simplesmente belo, sereno reflexo da beleza que Deus escondeu em todas as coisas!

Segundo Joseph Ratzinger, nosso Bento XVI, a arte cristã, hoje, encontra-se num dilema: por um lado, deve opor-se ao culto da feiúra, que diz que tudo o que é belo é uma ilusão e que só a representação do cruel, baixo e vulgar é a verdade, a verdadeira luz do conhecimento, que exprime a crua e verdadeira realidade. Nesta linha, pense-se na grosseria das novelas e filmes, pense-se em certa arte que se compraz no bizarro, no exótico e hermético... No fundo, tal arte exprime o não-sentido, o absurdo de uma realidade que não é fruto de um Lógos, de um Amor eterno. 

Por outro, deve a sensibilidade artística cristã contrapor-se à beleza fraudulenta, que faz com que o ser humano se rebaixe ao invés de fazê-lo grande, e que, por essa razão, é falsa. Aqui temos a arte do culto da forma sem conteúdo, como, por exemplo, a exposição do corpo humano, reduzido a objeto de sedução e incitação ao erotismo claro ou implícito... Nesta linha a realidade aparece desprovida de consistência: tudo é reduzido a consumo e satisfação dos próprios sentidos: fica-se na casca, na aparência das coisas, sem a capacidade de contemplar realmente o ser em toda a sua beleza e em todo o seu mistério! Nunca deveríamos esquecer que o ser, pelo simples fato de ser, de ter escapado do nada, é digno de admiração e profundo respeito! 

Ratzinger invoca a famosa a frase do grande escritor russo, Dostoievsky: “A beleza salvará o mundo”. De que beleza fala o ilustre pensador? Refere-se ele Àquela Beleza de que fala Santa Teresa d’Ávila: “Formosura que excedeis a toda formosura, sem ferir dor fazeis e sem dor desfazeis o amor da criatura!” Sim, a Beleza suprema que nos é dada a contemplar neste mundo, a Beleza, critério de toda outra beleza, a norma de toda estética realmente libertadora, é a Beleza redentora de Cristo, o crucificado e ressuscitado! 

Precisamos aprender a contemplá-lo, contemplar a beleza do Cristo – insiste Ratzinger. Contemplar significa entrar em simpatia, em sintonia com a estupenda realidade que ele representa e produz no mundo: um amor que se doa totalmente para nos redimir, para nos divinizar! Um amor que revela o sentido último de toda a realidade! Sem este amor, o mundo morre sufocado pela banalidade e a feiúra! Se nós o conhecermos, não apenas nas palavras, mas se formos trespassados pela flecha da sua beleza paradoxal, só então o conheceremos verdadeiramente, e não apenas porque ouvimos outras pessoas falando a seu respeito. E então teremos encontrado a beleza da Verdade, da Verdade que redime e seremos suas felizes e entusiasmadas testemunhas! 

Mas, precisamente aqui encontramo-nos na profunda crise do cristianismo atual, da Igreja dos nossos dias: perdemos o sentido da Beleza, do gozo de contemplar desinteressadamente! Nossa fé, nossa liturgia, nossa teologia tornaram-se demasiadamente conceituais, cartesianas! Há quem possa realmente alimentar sua fé, sua paixão por Cristo com a enorme maioria de nossas missas barulhentas, cheias de comentários, entupidas de paramentos de mal gosto, artificialmente criados por modas discutíveis? Há devoção que suporte uma missa na qual o padre inventa os gestos como um animador de auditório ou não exprime os gestos indicados no missal – gestos que não são seus, mas de Cristo e da Igreja? E os comentários dos nossos folhetos litúrgicos? E o “Reino”(= sociedade socialista), que substituiu Jesus? E a cruz retirada de nossos presbitérios? E a teologia escrita por gente sem fé e sem espírito contemplativo: teologia racionalista e rasteira, que eleva tanto quanto um voo de galinha? 

Nada pode pôr-nos em contato tão próximo com a beleza do próprio Cristo como o mundo de beleza criado ao longo dos séculos pela fé e a luz que brilha na face dos santos, através dos quais a própria luz do Senhor se torna visível. 

É pela falta dessa realidade que sentimos o peso de um cristianismo sem graça, de uma Igreja burocrática, de uma falta de espiritualidade sólida e profunda... É preciso urgentemente uma Igreja que volte ao silêncio, que volte ao belo, que volte ao rito litúrgico, que volte ao Cristo! O Santo Padre Bento XVI tem tentado bravamente fazer que o clero volte a este caminho. Poucos têm compreendido seu apelo e correspondido ao seu chamamento...

Fonte: Ecclesia Design

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