Estamos diante de uma belíssima pintura que relata uma página da Bíblia de alta densidade teológica e espiritual. Rembrandt van Rijn nasceu em Amsterdã em 1606, compôs mais de duas mil obras quase todas de inspiração religiosa. O que de imediato impressiona na pintura é a luz que nasce do íntimo dos personagens. O rosto do pai é de uma pessoa sofrida, transfigurada pelo amor; não enxerga mais por causa da espera prolongada, de olhar o horizonte de casa na esperança de ver o filho aproximar-se; este pai derramou muitas lágrimas pelo filho. A figura do pai que se debruça no filho, a curva que esta desenha, domina a cena e lhe confere uma majestade doce e materna, firme e feminina ao mesmo tempo.
O filho se modela e se aconchega, dentro deste arco amoroso, como se fosse um seio materno. Pai e mãe ao mesmo tempo, que regenera com o calor do seu amor o filho. Olhamos as mãos paternas: expressam o que a palavra não consegue dizer; existe um acordo secreto entre as mãos e o rosto: expressam amor, apoio, solicitude, firmeza e segurança. Notamos a diferença: a mão esquerda é máscula, forte e amparadora; a mão direita é delicada, fina e leve, como a mão de uma mãe, consoladora e carinhosa. Mãos que envolvem num abraço o próprio filho; mãos da criação que renovam vidas, mãos que revigoram no sofrimento humano. É assim que Rembrandt nos fala, através da sua arte pictórica, da figura de Deus como Pai.
O filho tem a nuca raspada que parece aquela de um deportado, um excluído, um despojado de dignidade, que conhece a fundo o drama do sofrimento humano. Sem importar-se com sua aparência, ele se esconde no colo do pai e descansa. Notamos a luminosidade da testa do pai, desce em vertical na cabeça, nos ombros e se irradia pelo corpo todo do filho, envolvendo-o numa luz amorosa e restauradora. Os pés do filho, sujos e cheios de feridas, lembram o longo caminho de retorno: as sandálias usadas e consumadas fala-nos de alguém que vem de longe. Agora ele está aqui, descalço, desanimado, sem nada, sem forças..., mas o pai já tem prontos a veste, o anel e as sandálias novas.
As cores, predominantes na pintura, são duas: o amarelo ouro que simboliza luz, irradiação e vida doada e o vermelho que significa amor, calor humano e doação total. O manto vermelho púrpura nos ombros do pai lembra o Salmo 32: "O teu amor me envolve como um manto". O pai e o filho mais velhos são parecidos. Ambos têm barba e usam largos mantos vermelhos sobre os ombros. Mas que diferença dolorosa entre os dois! O pai inclina-se sobre o filho oferecendo-lhe abrigo e aconchego; o filho mais velho fica reto, rígido na postura, apoiado num bastão que alcança o chão. O manto do pai é largo e acolhedor, o do filho mais velho cai rente ao corpo inflexível. As mãos do pai estão abertas e tocam, o filho que volta, em uma atitude de bênção; as mãos do filho mais velho estão entrelaçadas e mantém-se junto ao peito em uma atitude de fechamento e de egoísmo.
A única indicação de que se trata de uma festa é o realce dado a um tocador de flauta (quase imperceptível) esculpido na parede na qual se apoia uma das figuras femininas. No lugar de uma festa, Rembrandt pintou a luz, a luz radiosa que nasce do íntimo do pai e envolve o filho. É retratada a alegria serena e tranquila, silenciosa e mística que pertence à casa de Deus. O abraço do pai, cheio de luz, é a casa de Deus. Lá estão a música e a dança. O filho mais velho fica do lado de fora deste circuito de amor e perdão, recusando-se a entrar. Pe. Saverio
Fonte: Cristianismo e Arte
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