sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Escola de Arte Sacra e Ofícios de Pirapora do Bom Jesus

Jovens de 14 a 18 anos aprendem a arte de criar imagens sacras; atividade, além de gerar renda, trabalha costumes, tradição e cultura local

Por Daniele Próspero

A cidade de Pirapora do Bom Jesus, a 54 km de São Paulo, traz em sua história as marcas da fé e a devoção ao padroeiro, o Senhor Bom Jesus. Todos os anos o município recebe milhares de pessoas que vêm conhecer o Portal dos Romeiros, considerado um dos maiores monumentos da fé do Estado. É neste cenário que 35 jovens, de 14 a 18 anos, aprendem a arte de criar imagens sacras. A atividade, além de gerar renda para os jovens, resgata costumes, tradições e a cultura local. 



A Escola de Arte Sacra de Pirapora foi inaugurada em 2001 a partir de um projeto desenvolvido pelo escultor Murilo Moraes de Toledo, em parceria com a prefeitura da cidade. Murilo foi um dos artistas responsáveis pela criação do Portal e, durante este trabalho, percebeu que o aprendizado de um ofício no segmento das artes poderia ser uma oportunidade interessante para os adolescentes carentes da região. Com recursos do governo local, o artista começou a oferecer um curso de escultura para cerca de 12 jovens. Mas o número de alunos foi crescendo e a escola chegou a ter quase 70 alunos.

Devido ao espaço limitado e a falta de verba para atender todos os jovens, permaneceram nas atividades apenas aqueles que realmente demonstraram interesse pelo ofício e disposição para aprender e um novo curso de desenho foi também instituído. "Muitos querem ser artistas, mas poucos querem pagar o preço disso. É um trabalho que precisa ser levado a sério. Digo que o que faz o artista é a vontade dele. O que muda é a iniciativa, não o dinheiro que ele tem", comenta.

Além das aulas de escultura, muitos jovens da escola já participavam do curso de "Aprendiz de Turismo" oferecido pela organização não-governamental Fênix, localizada na cidade de Barueri, desde 1999. A ONG constatou as dificuldades enfrentadas pelo projeto e resolveu apostar na idéia, passando a colaborar com a iniciativa. "Percebemos que podíamos ajudar de alguma forma, pois o projeto, além de tirar os jovens da rua, ainda gera renda e incrementa o turismo local. Não é apenas dar alguma coisa, mas ensinar a pescar, como diz o ditado", afirma Maria Aparecida Marques, coordenadora da ONG, que oferece cursos de formação aos jovens e atendimento às famílias de baixa renda da cidade, beneficiando cerca de 350 pessoas. 


A organização procurou parceiros para o projeto e conseguiu o patrocínio do Instituto Junia Rabello, responsável pelo repasse de verba do Banco Rural. A parceria teve início em julho de 2003 e, desde então, o projeto foi reformulado e ganhou novos rumos. A escola passou a oferecer também um módulo básico de formação. Durante as aulas, os jovens aprenderam o que é cultura erudita, popular e de massa, estudaram religião, arte (técnica e inspiração), folclore, turismo e preservação cultural, além de anatomia humana, símbolos e ética e cidadania.

Por meio de dinâmicas e atividades em grupo, o educador Anderson do Prado procurou trabalhar a auto-estima dos jovens, mostrando a importância deles olharem para dentro de si. "Com isso, eles passaram a pensar no próximo, começaram a fazer planejamento e refletir sobre o futuro", recorda. "Já as aulas de história permitem que os jovens vejam com outros olhos a cidade em que moram e zelem também por ela. Assim, eles podem pensar em futuras soluções para os problemas locais", destaca Prado.

O jovem João Carlos Pereira Rocha, 18 anos, conta que aprendeu qual é a importância de superar limites e ampliar o conhecimento. Hoje, ele estuda todos os dias e procura aperfeiçoar sua técnica de escultor. João tem agora um ofício e pretende se dedicar integralmente à arte. "Às vezes, dá uma preguiça e vontade de desistir, mas temos que lutar sempre. É bom trabalhar com arte porque enquanto você está fazendo a escultura esquece dos problemas", conta o adolescente.

Atualmente, os alunos estão participando das atividades do módulo específico, com estudo dos materiais, confecção e montagem de peça, criatividade, acondicionamento de peças e uso do forno e queima das peças. Os alunos participam de uma vivência prática, com visitas programadas a feiras, museus e exposições em outras localidades, além de aprenderem técnicas de marketing para apresentar as peças no mercado. "As aulas de história auxiliam nisso também, pois eles aprendem a história dos santos e sabem o que estão produzindo. Torna-se um diferencial de venda. Mas em primeiro lugar vem a arte e depois o dinheiro. Somente quando a peça está pronta é que eles devem pensar na venda", destaca o escultor.

A qualidade das peças também é trabalhada com muito afinco para garantir maior aceitação das peças pelos comerciantes locais que, antigamente, compravam os produtos de outras cidades, pois no município não havia trabalho semelhante. As imagens produzidas pelos jovens são artesanais, feitas a partir da argila, um diferencial frente à produção industrializada de peças de gesso. Hoje, a escola já é conhecida na região e os jovens recebem diversas encomendas de imagens sacras. Eles apresentam seu trabalho em exposições, feiras e museus. 


José Aparecido da Silva Moraes, 19 anos, participa do projeto desde 2001 e trabalha todos os dias no ateliê, além de produzir outras imagens em casa. Ele conta que, no início, "tudo era muito difícil, principalmente porque não tinha nem idéia do que era uma escultura". "Lembro que tentei fazer uma imagem de Nossa Senhora e não saiu absolutamente nada. Mas fui melhorando". Para José, as aulas de ética e cidadania também foram importantes para aprender a lidar com as pessoas nas diversas relações do dia-a-dia. Hoje, com a venda das peças, o jovem consegue ajudar nas despesas da casa.

Murilo ressalta que, o grande benefício do projeto, é poder melhorar a auto-estima dos adolescentes, pois passam a ser valorizados na comunidade pelo seu trabalho. "Isso porque eles conseguem fazer algo que muitos não conseguem. A arte deixa o jovem mais sensível para a vida. Ele observa mais. É uma verdadeira terapia. Acredito que a arte seja um prazer gratuito", opina.

Com o objetivo de incentivar ainda mais o trabalho dos jovens, a escola irá lançar um prêmio para a imagem que transmitir mais emoção. Para isso, os alunos estão estudando retrato com um modelo vivo. A escola está agora em busca de novos parceiros. O contrato com o instituto foi finalizado no inicio deste ano e, por enquanto, as atividades se mantêm com a verba da prefeitura. A idéia, segundo Murilo, é criar o projeto "Invista num Talento", para incentivar as empresas a apoiarem financeiramente a escola e também adquirirem produtos (brindes) feitos pelos jovens. Outro projeto em vista é a criação da Vila das Artes, com vários ateliês e um ponto de venda das imagens sacras. Atualmente, os jovens estão trabalhando na montagem de um presépio para a cidade com peças em tamanho real. 


Fonte: WOOZ
Escola de arte sacra

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