quinta-feira, 5 de março de 2015

MP tenta descobrir origem de imagem sacra do século 18 devolvida espontaneamente

Imagem de madeira de Nossa Senhora do Rosário é entregue ao Ministério Público, que procura saber agora de qual igreja de Minas Gerais ela foi retirada há décadas

Por Gustavo Werneck

Imagem de madeira de Nossa Senhora do Rosário, do século 18, é entregue ao Ministério Público, que procura saber agora de qual igreja de Minas Gerais ela foi retirada há décadas

Há quase 12 anos envolvido na grande campanha de resgate dos bens culturais do estado, o Ministério Público de Minas Gerais, via Coordenadoria das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico (MPMG/CPPC), está às voltas desta vez com um mistério. Trata-se do recebimento, por devolução espontânea, de imagem de Nossa Senhora do Rosário, peça do século 18 de madeira policromada. Conforme primeira avaliação de historiadores da instituição, a obra pertence a uma igreja mineira. “Nossa missão agora é identificar a procedência da imagem. Já temos três pistas na investigação”, afirma o coordenador do CPPC, promotor de Justiça Marcos Paulo de Souza Miranda.

A entrega do objeto sacro, divulgada ontem, ocorreu em 10 de fevereiro, depois que uma pessoa ligou para o CPPC “dizendo que tinha uma coisa para entregar”, conta Marcos Paulo. Foi então que compareceu à sede da instituição, no Bairro Barro Preto, na Região Centro-Sul da capital, um homem levando a escultura enrolada em jornais antigos. Sem dispor de muitos dados, ele se limitou a informar que a imagem estava com a sua família havia mais de 30 anos e queria devolvê-la, “pois todos estavam incomodados e achavam que a peça deveria voltar à comunidade de origem”, diz Marcos Paulo.

“A decisão da família foi tomada, segundo o homem, depois da publicação da reportagem no Estado de Minas, em 22/11/2014, sobre a devolução ao CPPC, por duas pessoas, de oito peças que pertenceram à Igreja de Nossa Senhora da Conceição, erguida na segunda metade do século 18 e hoje em ruínas na Fazenda da Jaguara, ou Jagoara, em Matozinhos, na Grande BH. O templo tem a arte de Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1737-1814), cujo bicentenário de morte era lembrado naquele mês. “Ao que tudo indica, a imagem de Nossa Senhora do Rosário ficou embrulhada e guardada por mais de duas décadas no jornal, que é uma edição do EM da década de 1990”, revela o promotor de Justiça.

Pelas formas e demais características da escultura de 55 centímetros de altura, 32cm de largura e 20cm de profundidade, ela pode ter pertencido a templos católicos de Sete Lagoas e Curvelo, na Região Central, ou Minas Novas, no Vale do Jequitinhonha. “Uma das possibilidades é de que seja da Capela de Nossa Senhora do Rosário, do distrito de Tomás Antônio Gonzaga, em Curvelo. Já fizemos contato com o padre de lá. Nesse momento, é fundamental a participação da comunidade, principalmente dos mais antigos moradores, que podem ter alguma fotografia, se lembrar de celebrações, enfim, ter essa memória ”, orienta Marcos Paulo. De acordo com o Departamento de Cultura e Patrimônio da Prefeitura de Curvelo, a capela do distrito é do início do século 18, tem tombamento municipal e passa por vistorias periódicas.
Promotor Marcos Paulo de Souza Miranda diz que a escultura de 55cm está infestada de cupins
NOVO TEMPO Com certeza, acrescenta o promotor de Justiça, a escultura saiu do altar de uma igreja, pois traz na base um cravo que a prendia à peanha (pedestal de madeira). “Temos um mistério a desvendar”, ressalta. A imagem já passou por um processo de higienização e a próxima etapa será encaminhá-la para diagnóstico ao Centro de Conservação e Restauração de Bens Culturais Móveis da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais (Cecor/EBA/UFMG). Os testes deverão identificar o tipo de madeira, que se assemelha ao cedro. Tão logo seja restaurada, a escultura será integrada ao patrimônio cultural de Minas.

De grande beleza e obra de qualidade, segundo a equipe do CPPC, a imagem está infestada de cupins. Para evitar maior degradação, partes como o rosto da santa, o braço do Menino Jesus segurando o globo e outras foram acondicionadas separadamente, assim como a coroa de metal, considerada “muito bem trabalhada”.

A devolução mostra um novo tempo na história do resgate de peças desaparecidas, ao longo de décadas, de igrejas, capelas, museus e outras instituições de Minas. “Houve mudança na postura das pessoas. Em seis meses, tivemos três devoluções espontâneas”, afirma Marcos Paulo. A campanha em Minas deslanchou em julho/agosto de 2013, quando a Associação Cultural Comunitária de Santa Luzia, na Grande BH, ajuizou ação para recuperar três anjos pertencentes ao Santuário de Santa Luzia e que iriam a leilão no Rio de Janeiro (RJ).

Com a decisão judicial favorável, as esculturas do século 18 retornaram ao estado e ficaram sob guarda do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico (Iepha-MG), podendo hoje ser admiradas na Matriz de Santa Luzia. Um dos principais efeitos dessa luta foi a criação de uma força-tarefa para cuidar especificamente dos bens desaparecidos e, na sequência, estabelecimento de uma política específica para o setor. Minas Gerais já perdeu mais de 60% do seu patrimônio, devido a roubos, vendas ilegais etc. e, nos últimos anos, as autoridades conseguiram recuperar mais de 600 peças – muitas voltaram aos locais de origem e outras estão guardadas em reservas técnicas.

Memória
Peças devolvidas

Em novembro, um colecionador, cujo nome não foi divulgado, levou à sede da Coordenadoria das Promotorias de Justiça de Defesa do Patrimônio Cultural e Turístico (CPPC), em um caminhão, quatro peças de ferro que ficavam na torre esquerda da Fazenda da Jaguara, em Matozinhos, na Grande BH – cruz, haste de sustentação com sete metros de comprimento, galo e esfera armilar, com o sinal do poder da Coroa portuguesa. Já em madeira, foram restituídos os dois óculos frontais (aberturas na parede para entrada de ar e luz).


Em seguida, outro colecionador, também de nome não divulgado, surpreendeu a equipe do CPPC ao entregar um conjunto de portas frontais, com duas bandeiras e duas partes superiores (sobrebandeiras), de madeira, e o conjunto de portas laterais. O ponto de partida para entrega das peças ocorreu em 20 de março de 2014, quando o coordenador do CPPC, Marcos Paulo de Souza Miranda, publicou no EM o artigo “Jaguara: igreja mãe”. Os objetos devolvidos foram encaminhados pelo promotor de Justiça ao Museu Mineiro, em Belo Horizonte.

SERVIÇO

PARA DENUNCIAR    


Quem tiver informações sobre peças desaparecidas pode acionar os seguintes órgãos

Ministério Público de Minas Gerais

» e-mail: cppc@mpmg.mp.br e telefone (31) 3250-4620. Pode também enviar correspondência para Rua Timbiras, 2.941, Bairro Barro Preto, Belo Horizonte. CEP 30.140-062

Iphan

» Para obter ou dar informações, basta acessar o www.iphan.gov.br e verificar o banco de dados de peças desaparecidas. Denúncias anônimas podem ser feitas pelo telefone (21) 2262-1971, fax (21) 2524-0482, pelo e-mail bcp-emov@iphan.gov.br, ou no próprio banco online

Iepha/MG

» www.iepha.mg.gov.br ou pelo telefone (31) 3235-2812 ou 2813
Fonte: EM

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