quarta-feira, 8 de novembro de 2023

Canto gregoriano para compreensão

texto de: 
Jesús Jáuregui Gorraiz




Membros da Schola Gregoriana Gaudeamus. D. N.


De profundis, das Profundezas, onde nasce o Silêncio, onde os Desejos começam a ascender, emerge um canto que é apenas o eco de um murmúrio – o Criador? –, um rugido – Criação?


A música gregoriana aderida à pedra fria do Santuário sobe até à cúpula abobadada da abside onde os melismas saltam e descem, como um nevoeiro quente, sobre a cabeça dos fiéis, descansando e abrandando a sua queda nos quilismas, notas recortadas que sustentam o som. . Começa o canto da Antífona I, Jerusalém, gaude gaudio magno… Aleluia. Ao final, o Silêncio e o Desejo que chegam do Profundeza reverberam na ampla nave do século XI.


Há algo de aéreo nesta música que flutua na austera ornamentação românica, enredada nas formas alegóricas dos capitéis e nas imagens didáticas dos frisos exteriores. O canto gregoriano tudo engloba, resume tudo e torna-o inteligível ou, pelo menos, aproxima-o do conhecimento do divino. Basta ouvir e deixar a música se sentir transportada para a Transcendência. Manuel Olasagasti, teólogo capuchinho, chegou à conclusão de que a música (especialmente no que se refere às cantatas de Bach) contém em si mais argumentos para compreender a ideia de Deus do que toda a Summa theologica de São Tomás. E o canto gregoriano é o maior expoente.


Cântico das Primeiras Vésperas do Advento. Exspectetur sicut pluvia eloquium Domini; et descendet super nos sicut ros Deus noster… “A mensagem do Senhor descerá sobre nós, como chuva, como orvalho…”. A música acompanha esse pedido, começando pela suave e silenciosa nota G, e subindo até encontrar altas tessituras que destacam a ideia de nuvem, de chuva. O tom é sustentado e depois desce, et descendet, sobre nós, sobre os homens.

E se é lindo ouvir, é ainda mais lindo cantar. Sentir que a voz sai acompanhando a letra em comunhão com a história bíblica, expressando a saudade do Advento, da vinda, como a Natureza anseia por todas as chuvas. Depois, o canto do Salmo 115 com melodia repetida espalha orações e louvores por todo o templo que flutuam como fumaça de incenso, como o eco de um mistério, suspenso como um pensamento que não se deseja ou não pode ser expresso.

No momento em que escrevo, nas terras de Abraão, nos templos de Yahweh e nos locais de oração a Allah, cai uma chuva metálica que mata. Como soa fora de tempo a Antífona I!: …quia veniet tibi Salvator! “…porque o Salvador virá até você.” Ninguém vem salvar os israelitas, os habitantes de Gaza, os habitantes da Cisjordânia, nem os judeus, nem os muçulmanos. Meditabor in mandatis tuis. “Meditarei em seus comandos.” Talvez devêssemos repensar porque abandonámos a ideia da existência de um Presidente e porquê a sua substituição por estranhos, chegando em enormes aviões brancos portando armas que matam e destroem.


Canto gregoriano, música de paz para nós que ansiamos pela sua chegada.

*O autor é membro da Schola Gaudeamus

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