segunda-feira, 24 de junho de 2013

Igreja em Ribeirão (SP) foi demolida para dar espaço à imponência de outra

A economia em alta pelo ciclo cafeeiro permitiu excessos em Ribeirão Preto (313 km de São Paulo). Um dos maiores foi a demolição, em 1905, da primeira Igreja Matriz construída na então Vila do Ribeirão Preto, na praça 15 de Novembro.

O argumento era que o então teatro Carlos Gomes era maior que a velha matriz. As lideranças da época consideraram a igreja inadequada à importância que a cidade exercia na região.
Resolveram, então, construir a atual Catedral Metropolitana em um ponto mais alto.
À época, o padre Joaquim Antônio de Siqueira afirmou que a antiga matriz, “com quanto passasse por algumas reformas”, estaria “bem longe de ser o templo que reclama esta importante, rica e esperançosa localidade”.
Houve uma concorrência para erguer o prédio. O projeto escolhido foi o do arquiteto Carlos Ekman, e as obras começaram em 1902.
Segundo a pesquisadora Valéria Valadão, o projeto era o mais exequível e o que mais se aproximava dos termos do edital. “O primeiro, de Victor Dubrugas, foi escolhido como o mais belo, mas venceu o de menor valor”, disse, em seu mestrado sobre a memória arquitetônica de Ribeirão.
Antiga igreja Matriz de Ribeirão Preto, que foi demolida em 1905 e substituída pela atual catedral, mais “imponente”. Reprodução.
A catedral, no estilo gótico, acabou sendo inaugurada em 1917, ainda sem torre.
Outras perdas
Já desativado desde a época do Estado Novo (1937-45), o prédio do antigo Hospital de Isolamento, ou Lazaretto, foi demolido em 1964.
Com projeto do engenheiro Joaquim Mariano de Amorim Carrão e concluída em 1897, a unidade foi construída como parte da política de higienização e saneamento básico das cidades brasileiras, empreendidas pelo Estado.
O objetivo da época era controlar as frequentes epidemias do final do século 19.
Havia recomendações especiais quanto a hospitais de isolamento: a planta apresentava a forma de cruz. O bloco principal tinha varanda destinada aos leitos e blocos secundários (transversais) reservados aos serviços.
Ele era isolado do chão por meio de porões não habitáveis com a finalidade de torná-lo mais salubre. Os únicos registros do hospital –fotos e documentos– estão disponíveis no Arquivo Público e Histórico de Ribeirão Preto.
Antes, em 1883, com a chegada da linha férrea, instalou-se na cidade a Companhia Mogiana. O objetivo era escoar a produção de café de toda a região para o porto de Santos. A estação se tornou a de maior faturamento entre todas as da empresa.
O mercado municipal, construído em frente à estação, foi inaugurado em 1900. A exploração do espaço foi feita durante nove anos pela mesma empresa que o construiu. Após o período, a prefeitura incorporou o imóvel ao patrimônio público e passou a responder pela gestão.
O edifício, de planta quadrangular, era composto de um pavimento térreo com acesso pelos quatro lados. Porém, tudo foi destruído por um incêndio em 7 de outubro de 1942. Após o acidente, a prefeitura construiu o prédio atual, localizado em frente à rodoviária.
Uma das atrações do espaço é o painel de mosaico do artista plástico italiano Bassano Vaccarini (1914-2002), uma das referências da época.
Conheça a Ribeirão Preto “que não existe mais”
Palacete Innecchi (à esq.), na rua Duque de Caxias, onde hoje existe uma agência bancária; ao lado, o atual prédio do Marp (Museu de Arte de Ribeirão Preto). Arquivo Público e Histórico de Ribeirão Preto
O teatro Carlos Gomes, na praça de mesmo nome, que foi demolido na década de 1940. Arquivo Público e Histórico de Ribeirão Preto
Prédio do antigo Hospital de Isolamento ou Lazareto, demolido em 1964, quase 30 anos depois da sua desativação pelo Estado Novo. Arquivo Público e Histórico de Ribeirão Preto
Antiga estação ferroviária de Ribeirão Preto, onde atualmente funciona a UBDS Central. Arquivo Público e Histórico de Ribeirão Preto
A economia do café proporcionou riqueza e desenvolvimento para Ribeirão Preto (313 km de São Paulo) a partir do final do século 19. Mas bastou a crise desencadeada pela quebra da Bolsa de Nova York e o início da grande depressão global, em 1929, para que símbolos do período –teatros, casarões e igreja– fossem ao chão nas décadas seguintes.
Um dos casos mais simbólicos foi a demolição, em setembro de 1946, do teatro Carlos Gomes, onde hoje está a praça de mesmo nome. A ele somam-se o palacete Paschoal Innecchi e a estação ferroviária da Companhia Mogiana, entre outros.
Construído pelo arquiteto Ramos de Azevedo, o teatro foi financiado por grandes fazendeiros da época. A inauguração, em dezembro de 1897, foi com a ópera “O Guarany”, de Carlos Gomes.
Na história cultural brasileira, o teatro ganhou importância por ter sido erguido dez anos antes do Municipal de São Paulo, também projetado por Ramos de Azevedo.
A construção seguiu o estilo neoclássico de influência italiana. Segundo os jornais da época, as escadarias eram em mármore Carrara; os candelabros, de bronze alemão; e os vitrais tinham cristais de Murano. O espaço interno, inspirado nos modelos europeus, tinha plateia oval com capacidade para 400 pessoas e cadeiras no estilo Luís 15.
“Porém, a crise o tornou velho e decadente, sendo demolido para dar espaço ao comércio”, afirma a pesquisadora Liamar Tuon, professora e coordenadora do curso de história da Faculdade São Luís, de Jaboticabal.
De acordo com o arquiteto Onésimo Lima, o Carlos Gomes foi o edifício mais importante do ciclo cafeeiro. “Após a crise, foi substituído pelo Theatro Pedro 2º, acabado às pressas, com material de segunda”, disse.
Até a quebra da Bolsa de Nova York, Ribeirão viu sua fase de glamour com o funcionamento de cassinos como o El Dorado e o Antarctica. Nessa época, surgiu o palacete do imigrante italiano e industrial Paschoal Innecchi, na esquina das ruas Duque de Caxias e Barão do Amazonas, onde hoje está o Itaú.
Disputa
A construção eclética, formada por fragmentos de estilos arquitetônicos diferentes, teria sido uma resposta de Innecchi à elite ribeirão-pretana por não ter sido aceito nos eventos sociais.
Suas festas competiam com eventos da Recra, que ficava ao lado, numa tentativa de demonstrar poder. Foi demolido após sua morte, em 1961.
Para Lima, o que persiste da época é a falta de preservação da história de Ribeirão. Por Venceslau Borlina Filho

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